Artigo publicado em publico.es e traduzido por esquerda.net
"Se falarmos de nacionalização e rede elétrica provavelmente a primeira coisa que nos virá à mente será a Bolívia, onde o Governo de Evo Morais nacionalizou recentemente várias empresas de transporte e distribuição de eletricidade. Em duas ocasiões, a repercussão mediática em Espanha foi muito ampla porque as multinacionais proprietárias destas redes eram espanholas. A empresa Transportadora de Eletricidade (TDE) que era propriedade da Rede Elétrica Internacional foi nacionalizadaem maio de 2012 e as distribuidorasElectropaz e Elfeo, anteriormente nas mãos da Iberdrola, foram nacionalizadas em dezembro desse mesmo ano. Alguns argumentos para propiciar um debate informado sobre estes processos, que não é o objetivo deste artigo, podem ser encontrados nos links anteriores.
No entanto, a decisão de numerosos municípios alemães de tornar pública a gestão das suas redes de distribuição elétrica tem tido bastante menos repercussão mediática. Num artigo recente falámos da mudança da produção elétrica na Alemanha para um mixbaseado em renováveis e de como os consumidores assumiram o custo desta transição. Neste texto, passamos em revista algumas das recentes remunicipalizações ocorridas na Alemanha.
Uma das localidades pioneiras na constituição de uma empresa de eletricidade municipal foi Schönau. Depois do acidente de Chernobyl em 1986, a convicção de um grupo de cidadãos de querer deixar de consumir eletricidade de origem nuclear levou à criação da empresa municipal de eletricidade EWS em 1994. Três anos depois, e após dois referendos públicos, a EWS ficou com a distribuição da eletricidade na localidade.
O recomendável documentário “O espírito de Schönau” sublinha como a consciencialização cidadã foi chave para o sucesso desta empresa. Numerosos concertos, conferências e visitas porta a porta conseguiram mobilizar a cidadania para lutar contra a máquina de comunicação da companhia, que operava a rede em regime de monopólio até então. A principal argumentação dessa companhia era que a recém constituída empresa municipal era formada por um grupo de ativistas que não saberiam pôr a funcionar a rede. Hoje, 17 anos depois, a EWS continua a distribuir eletricidade em Schönau a preços muito competitivos e é produtora de metade da energia que distribui, vetando a energia nuclear e favorecendo o fornecimento de energia de origem renovável. A EWS converteu-se, além disso, na primeira empresa de comercialização de energia verde para particulares e abastece atualmente 150.000 casas com a sua eletricidade.
Com este mesmo espírito, 72 empresas elétricas municipais foram criadas na Alemanha desde 2005 centradas na obtenção de melhores resultados quanto a impacto económico local, transição energética e proteção do meio ambiente. Objetivos que dificilmente podem alcançar-se deixando que todas as decisões sejam tomadas com base no livre mercado. Esta onda de remunicipalizações dá-se porque nos últimos anos estão a caducar muitas das concessões privadas que se concederam por um período de 20 anos. A maior destas remunicipalizações foi levada a cabo recentemente na cidade de Hamburgo, onde os cidadãos decidiram democraticamente remunicipalizar as redes de distribuição de eletricidade, gás e aquecimento doméstico.
Em Berlim também está a haver debate sobre a remunicipalização, ainda que a ideia não tenha vencido num referendo recente. Neste caso, os cidadãos queixam-se de que a empresa que fornece a eletricidade, a Vattenfall, baseia a sua produção exclusivamente em centrais de carvão, com a consequente contaminação associada. Além disso, o desenvolvimento das renováveis na capital alemã é praticamente nulo. Por último, a cidade de Stuttgart também viveu um processo de recuperação do controle público na gestão dos serviços. Em 2011, o Governo local recuperou a empresa pública Stadwerke Stuttgart e desde março de 2014 esta empresa está encarregada, juntamente com a elétrica EnBW, de administrar as redes de gás e eletricidade da cidade.
Extrato de artigo de Marta Victoria e Cristóbal J. Galego, colaboradores do círculo de Economia, Energia e Ecologia do Podemos, publicado em publico.es e disponível também em Observatorio Crítico de la Energía. "
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